Dito isto, é importante saber que esta relação entre ansiedade e pavimento pélvico constitui um processo com dois sentidos, pois ambos os problemas se reforçam mutuamente. O stress e a ansiedade danificam o pavimento pélvico e os problemas derivados dessa lesão (incontinência, prolapso, entre outros) provocam ansiedade em quem os sofre.
Um estudo publicado na International Urogynecology Journal em 2018 (Nygaard I. et al., “Association Between Anxiety and Pelvic Floor Disorders in Women”) revelou que as mulheres com ansiedade têm até o dobro do risco de apresentar sintomas de disfunção do pavimento pélvico, como incontinência urinária, pressão pélvica ou dificuldade em esvaziar completamente a bexiga. O dobro.
É imperativo quebrar o círculo vicioso, recorrendo às ferramentas ao nosso dispor. Como primeira medida, importa tentar atenuar a ansiedade, sendo que os especialistas recomendam adotar uma abordagem multidisciplinar, integrando avaliação psicológica e tratamento emocional.
Quando a ansiedade afeta o pavimento pélvico (e vice-versa)
A chave para quebrar o círculo vicioso referido está em abordar e tratar a ansiedade ao mesmo tempo que se treina e melhora o estado do pavimento pélvico, numa perspetiva integradora. Porque uma realidade não se compreende sem a outra. Para começar, é importante ter em mente que os clássicos exercícios de Kegel (contrações voluntárias do pavimento pélvico) não estão indicados neste caso. Aqui, a prioridade é aprender a relaxar os músculos quando o estado de nervosismo nos leva, inconscientemente, a contraí-los.
Por vezes, o simples ato de respirar conscientemente pode ser fundamental para começar a quebrar a relação tóxica entre ansiedade e pavimento pélvico – algo que está na base de uma conhecida disciplina de autocuidado: o mindfulness.
Se apenas deseja aprender a relaxar um pavimento pélvico tenso, tenha em conta este exercício baseado na respiração, capaz de libertar a zona pélvica:
- Adote uma postura confortável (sentada ou semi-recostada)
- Inspire profundamente pelo nariz, sentindo o abdómen expandir-se
- Expire lentamente, tentando sentir que o pavimento pélvico desce suavemente
- Repita várias vezes, sem pressa, durante cinco minutos, pelo menos duas vezes por dia
Contudo, se desejar ir um pouco mais além, poderá recorrer a sessões diárias de mindfulness. Através de uma varredura corporal controlada, auxiliada por respiração consciente, é possível reduzir a perceção de tensão pélvica e, com o tempo, diminuir os episódios de incontinência relacionados com a ansiedade e o pavimento pélvico.
O objetivo principal da prática consiste em aprender a não reagir aos estímulos que provocam urgência urinária e que a ansiedade impede de gerir. Estar consciente do corpo, concretamente da zona onde se situa o pavimento pélvico, aqui e agora, pode ser uma poderosa ferramenta para controlar a bexiga e ajudar a descondicionar as respostas automáticas do corpo perante esses estímulos (como ouvir água a correr, chegar a casa ou o simples pensamento de urinar).
E não somos só nós que o afirmamos. Esta teoria baseia-se em estudos como o de Rittenhouse et al. (2021), “Mindfulness, Transcranial Stimulation Promising for Urgency Urinary Incontinence”, publicado em 2025 na revista Continence, que demonstrou melhorias reais em mulheres com incontinência de urgência através do uso de mindfulness estruturado.
Mindfulness contra a incontinência
Qual seria a estratégia para utilizar o mindfulness a fim de quebrar o vínculo entre ansiedade e pavimento pélvico? Simples: primeiro, aprender a reconhecer e regular as sensações de urgência sem reagir automaticamente; depois, reduzir a tensão no pavimento pélvico, além de diminuir a ansiedade antecipatória associada à incontinência e, por fim, criar um novo padrão de resposta que seja: observar – aceitar – escolher.
Com este propósito, o protocolo passo a passo seria o seguinte:
- Uma vez por dia, durante vinte minutos (pelo menos quatro vezes por semana), sente-se ou deite-se confortavelmente e feche os olhos.
- Faça três respirações profundas e prepare-se para aprender a viver no aqui e agora: observe sem reagir, escute o seu corpo sem julgar.
- É o momento de iniciar a varredura corporal, detendo-se na zona pélvica. Observe se há tensão, calor, pressão, medo… sem alterar nada.
- Repita mentalmente: “O meu pavimento pélvico não precisa de estar em alerta.”
Praticado sistematicamente, este simples exercício reduz a hiperativação muscular relacionada com o stress. Uma vez dominada a varredura corporal, pode passar ao exercício seguinte, em que se expõe de forma consciente a estímulos semelhantes aos que geram urgência:
- Imagine que ouve a água a correr da torneira e sinta como surge a urgência.
- Nesse momento, inspire profundamente, observe a sensação e diga: “Não é uma emergência, posso sentir a sensação e não há problema.”
- Enquanto a urgência diminui, mantenha a atenção na respiração.
- Uma vez acalmada a urgência, realize um exercício de relaxamento ativo do pavimento pélvico: inspire e visualize o pavimento pélvico a descer, como se se expandisse em direção ao chão.
- Expire e sinta-o relaxar. Não o contraia (não se trata de um Kegel), apenas observe-o como uma flor que se abre.
Durante toda a sessão, pode ancorar-se a uma frase como esta: “A urgência é uma sensação, não uma ordem. Respiro, observo e escolho como agir.”